as atrizes Potira Castro e Tânia Barbosa no "Inspetor Geral" |
Quando
fui convidado por Antônio Melo para escrever sobre Teatro-Educação no
EuVejoArte, percebi que abordagens anteriores a linguagem cênica precisavam ser
disseminadas, um fio condutor como uma base para a mediação de elementos da
arte e da comunicação que entrelaçam-se nesse balaio cultural tão pouco
valorizado na nossa cultura. Portanto, sempre que possível estaremos publicando
esses adendos elucidativos. Boa leitura e reflexão!
Segundo
Gilles Deleuze (1992), comunicação é transmissão e a propagação de uma
informação, que nada mais são do que palavras de ordem, onde seus emissores
estão acreditando que seus receptores creiam na propagação de suas palavras de
ordem.
Quando uma autoridade qualquer nos comunica uma informação eles supõem
que devemos crer e que temos a obrigação de crer, ou pelo menos fazer de conta
que se crê, eles simplesmente pedem que nos comportemos como se acreditássemos,
em suma a informação é a ferramenta de controle. Nos dias de hoje estamos
entrando na sociedade de controle, onde as informações regem a sociedade, por
isso o papel da arte é imprescindível, como forma de contrainformação, mas
desde que seja convertida em forma de resistência. Qual a afinidade de uma obra
de arte e o ato de resistência? Uma obra de arte não é um instrumento de
comunicação, ela é um ruído que causa estranhamento no canal, como um rádio que
esta fora de sintonia e faz com que você tire o traseiro do assento confortável
e vá até o aparelho para certificar o que está acontecendo. A arte além de
cumprir um papel estético ela tem a função de tirar as pessoas do estado de
catatonia social, como que dando-lhes um chacoalhão para que acordem pra vida.
Para
entender melhor o papel da comunicação na sociedade moderna precisamos nos
remeter a uma questão anterior. O indivíduo, mediante sua evolução como ser
linguístico, compreendeu a necessidade de convivência no coletivo. Para os
pensadores contemporâneos existem três tipos de comportamentos coletivos
(Oliveira, 2003), dentre eles:
- Multidão – origem
biológica, comandada pelos ferormônios, isenta da racionalidade, ação cojunta
como um só ser. Está atrelada aos primórdios da humanidade quando o indivíduo
percebeu a importância de se viver em sociedade. Ações de revolta e
manifestações em grandes multidões. São necessários quatro estágios para que
ocorra essa comoção emocional coletiva
1º- acontecimento
emocionante - um acontecimento de grande comoção social, como há pouco
tempo ocorreu nos trens paralisados no rio de janeiro, a revolta dos usuários é
um grande exemplo disso;
2º- “moedura”
– encontro da multidão e troca de ferormônios entre os indivíduos
3º- ideia
de ação – a exaltação coletiva é direcionada para um objetivo comum,
quebrar o trem, por exemplo;
4º- corpo
uno – estágio em que a multidão torna-se uma só pessoa e agem com o
mesmo fim, ações instintivas promovidas pelos ferormônios.
- Massa –
surge na era industrial com o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa,
explorando o lado irracional e manipulável da multidão de forma
individualizada, sem o contato físico. A massa acredita que pensa, porém apenas
ecoa o que recebe dos meios de comunicação, que funcionam como uma agulha
hipodérmica que injeta a substância diretamente na veia com resultado imediato.
No intuito de ser aceito pelos seus pares o indivíduo repete costumes como a
moda, por exemplo. Como a massa é dotada de um pseudo-pensamento ela necessita
de um líder, um ídolo, um herói que lhes diga o que fazer guiando seus passos,
por conta de suas mentes ocas e alienadas, verdadeiros indivíduos idiotizados e
manipuláveis, escravizados pelos meios de comunicação de massa que acomoda cada
indivíduo por conta de uma idolatria psicológica.
- Público – é
o indivíduo maduro que raciocina e que possui uma percepção apurada da
realidade, que defende a liberdade de expressão, seu conceito individualizado
com alto grau de criticidade e reflexão, que reflete uma vida social mais
questionadora, não se importando com o pathos,
diferenciada dos demais conceitos explanados anteriormente.
Sim,
mas onde podemos chegar com tudo isso? É muito simples, dando nome aos bois
podemos entender como se dá o processo de dominação através dos meios de
comunicação e que podemos resistir através da propagação da cultura genuína
pelo fazer artístico. Tivemos recentemente no Teatro Municipal de Ilhéus a
apresentação da peça “O Inspetor Geral” do TPI (Teatro Popular de Ilhéus), que
diferentemente dos espetáculos dos globais que por aqui se apresentam.
Utilizando-se da arte como forma de resistência o grupo dirigido pelo brilhante
Romualdo Lisboa, que não se preocupou em adocicar a peça ao adaptar na forma de
cordel o texto de Nikolai Gogol. Ao invés de levar ao público o “consumo” de uma
historia mais palatável, mostrou sim de forma criativa e corajosa todas as
engrenagens de um sistema falido e que beneficia uma pequena minoria em detrimento
do sacrifício de milhares de pessoas. Incomodando ao invés de acomodar, o TPI
mais uma vez rompeu com o establishment, sendo
original na contextualização dos diálogos adaptados a realidade local, provando
sua competência para se apresentar no SESI de São Paulo, além do merecimento de
concorrer ao Prêmio Shell de Teatro e de participar do Festival de Teatro de
Curitiba, um dos mais importantes do Brasil. Aproveito a oportunidade para
externar minhas congratulações a todos os atores que desempenharam
perfeitamente seus papéis, no entanto gostaria de ressaltar o desempenho cênico
dos atores que representaram os personagens: a Esposa do Prefeito, Tânia
Barbosa, o Músico e Chefe dos Correios, Elielton Cabeça e o Criado Takaro Vitor.
REFERÊNCIAS
DELEUZE, Gilles. “Controle e Devir”. In: Conversações(1972 – 1990). Tradução de Peterz
Pál Pelbart. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.
OLIVEIRA, Ivan Carlo Andrade.Teorias da
Comunicação. Brasil: virtualbooks.com.br, 2003.