Início

terça-feira, 11 de setembro de 2012

CULTURA PRA QUÊ? Ser ator de TV ou de Teatro? Eis a questão - por ED PAIXÃO

"1951 - Inauguração da TV Tupi no Rio de Janeiro." 

É preciso apreender que nem sempre estar numa TV significa que uma determinada pessoa é de fato um bom ator ou atriz. Existe uma diferença enorme para quem vem do teatro e quem ingressa na TV sem passar por ele antes, e as duas formas de expressões são tão distintas quanto água e óleo num mesmo copo, contudo comungam de um mesmo objetivo, comunicar. 

A TV é algo mais visual e corrido, sobra pouco tempo para o ator se aprofundar numa personagem por exemplo. O teatro já segue o caminho oposto, ele é irradiado de calor humano, você tem a resposta do público ali, na hora, é certo que é um publico bastante reduzido se comparado a TV, entretanto a sensação de está ali no palco, divertindo, emocionando, passando informações lúcidas, lúdicas, defendendo uma ideologia é algo que não tem preço, é um verdadeiro deslumbre para o ator de teatro, além do processo de laboratório e pesquisa ser mais intensificado em paralelo ao mundo atrás das câmeras.


Então vamos aos contras do teatro em relação à TV; basicamente o surgimento da TV no Brasil acabou com o intenso movimento de teatro que vinha se fortalecendo na década de 50, as pessoas passaram a não sair mais de casa para assistir uma peça, o sedentarismo passa a imperar e seguindo a enorme onda crescente, arrebatadora de público, chamada televisão, tendo como emissora pioneira a extinta TV Tupi, muitos atores consagrados de teatro migram para essa nova forma de entretenimento como é o caso de Fernanda Montenegro, Paulo Autran, Othon Bastos, Tarcísio Meira, Glória Menezes e etc. e isso justifica a boa fase inicial que a TV viveu, trazendo muito do universo teatral para as câmeras e com excelentes interpretações e roteiros baseados em peças de teatro. Porém desde o instante em que a TV surge com seu poder de alienação em massa, ela vira inimiga declarada do universo teatral. Engana-se quem pensa que os dois falam a mesma língua. Muitos grupos de teatro tentam resistir sem sucesso ao poder de influência que a TV exerce sob as pessoas e por isso muitos deles são obliterados, erradicados neste embate.

Uma vez que um ator tem um rótulo de uma emissora nas costas, ele passa a ser um deus, mesmo que ele venha de programas como Malhação da rede globo - onde o programa é claramente um ninho de atores iniciantes que estão sendo testados na emissora – No entanto é o seu rótulo de ator de TV que vai levar o grande público a ir ao teatro, para vê-lo pessoalmente, tirar fotos e postar em redes sociais. As pessoas não vão ao teatro para assistir ao espetáculo ou ver o trabalho de grupo e sim, o deus, luminoso, radiante em cena. Muitos atores que iniciam no meio teatral sonham um dia ir para a TV, não sabem eles, que a maioria daqueles que estão ali na tela são pessoas financeiramente estáveis, pessoas vindas de famílias ricas e esse é o motivo deles estarem ali, naquele ambiente.

Os atores que estão sempre em evidência, pulando de novela em novela - “os consagrados” - são os que realmente enriquecem; os outros que fazem uma ponta aqui ou acolá têm que se desdobrar com outros lances enquanto esperam serem chamados para participar de alguma outra novela, ou seja, é como um frigorífico, cheio de atores na geladeira, quando precisam, descongelam aquele que melhor convir, enquanto os outros permanecem congelados e se eles não tiverem estabilidade financeira, não conseguirão manter-se naquele meio por muito tempo e terão que encontrar outra forma de viver, provavelmente terão que se adequar ao sistema capitalista, servindo a sociedade de consumo, trabalhando em indústrias, órgãos públicos e etc. É importante advertir que está nos holofotes da TV ao mesmo tempo que é sinônimo de fama, também é sinônimo de investimentos, aplicação de capitais em troca da cobertura midiática. O artista precisa pagar um agente para descolar comerciais, entrevistas e outras coisas, alguns até pagam paparazzis para tirar fotos e divulgarem a respeito de sua privacidade, ou então pagam para espalharem boatos e polêmicas com o seu nome - puro jogo de marketing - e, além disso, evidencia o forte narcisismo do qual eles sofrem, todavia também existe outro lado, o lado dos artistas da classe C, eles representam a minoria na TV, esses precisam trabalhar bastante para continuarem neste círculo e merecem crédito, porque quando não conseguem uma ponta, trabalham na técnica, nos bastidores; um trabalho intenso e sem descanso e ainda enfrentam um preconceito forte da classe artística dominante no set ou estúdio. Está ali, é uma vitória contra todas as coisas.

A força que o nome de ator ganha quando ele ingressa na TV é monstruosa.  O nome passa a ser comentado em tudo que é rede social, uma celebridade instantânea é criada, porém a fama também traz seus infortúnios, muitos grupos de teatro com posicionamento político contra a TV, não aceitarão essa fama, por isso esse ator, uma vez que faz parte de um grupo com esse posicionamento, deve sair dele para não prejudica-lo. Se não, o público virá ao teatro não mais para assistir a peça. Ratificando que o ator, independente do veículo a seguir, deve se preocupar sempre em ser profissional, fazer o seu papel, interpretar sempre com emoção e veracidade, deve mostra-se interessado em pesquisar e fazer laboratório do trabalho proposto. Como disse Jeam Pierre Kuhl, diretor e preparador de atores: “O teatro você escolhe fazer e a TV escolhe você”. Teatro é uma coisa que está no sangue como um vírus incurável, mesmo que o ator faça TV, ele nunca vai conseguir largar o teatro, já que ali no palco ele tem a liberdade de criação, de expressão, estabelece-se uma troca mútua de energia com o grupo de atores em cena e o público, obtendo-se imediatamente a resposta da plateia, os aplausos ou a vaia e cada apresentação é algo único e pertence apenas aqueles que comungaram daquele momento. O saudoso Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, grande diretor de teatro e TV bem disse e faço minhas as suas palavras: "Cada vez que um pano-de-boca se abre no Brasil, cada vez que um refletor se acende, soam trombetas no céu; trata-se de uma vitória da cultura, qualquer que seja o espetáculo". Claro que essa postagem é uma visão pessoal de um ator que prioriza o trabalho de grupo no teatro e quem for contra tudo que escrevi que argumente e derrube meu ponto de vista. Esse é o meu ponto de vista e o seu?


 _____________________________






Ed Paixão é ator, professor de teatro, palhaço e conselheiro municipal de cultural da área temática de teatro.

Nenhum comentário: