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domingo, 23 de outubro de 2011

Vamos falar de Tereza - crônica de Daniel Prudente


Qualquer coisa que me faltasse na boca era coisa certa, coisa de bicho. Então ficava só falando, virando a coisa pra baixo, empurrando o peso pra não se mexer. 

Ia dizer que a tosse do mundo me doía, e também que eu dirigia um carro grande e muito veloz pela rua do comércio e, caindo por cima da palavra, eu disse assim: choveu mais cedo. 

Tereza me olhou com tanto amor que eu pensei que fosse Jesus.
Eu me canso Tereza, de ser gente, e isso eu também não disse. Fiquei olhando ela. Olhando ela de novo, e de novo. Que eu me sentia bem. Tereza era mulher pra que dissesse pouco.

Meu braço corria teso para frente do peito, no volante, amassando as costas contra o banco do carro, sobrava para fora da janela o outro braço, e assim eu dirigia ferozmente pela cidade escura, levando Tereza pra casa, porque era tarde e a Cidade de Ilhéus pingava as gotas de água laranja por debaixo dos postes da avenida.  Coberta de chuva, a cidade avermelhava o chão de pedras de basalto, e me trazia de volta à boca a palavra certa, que eu gostava de Tereza, e de como ela sim, falava, e falava bem.