Hoje acordei leve, bem disposta e com um balanço diferente no
caminhar. Olhei o sapatinho que deixei na janela e ele estava com um recheio
saborosíssimo. Depois do café da manhã, senti flutuar minh’alma e não pude
cantarolar outra coisa, me rendi à bossa mais bossada que eu conheço, ao swing misterioso de João Gilberto.
Baiano de Juazeiro e violonista desde os 14 anos de idade, João era
considerado um músico especial. Na década de 1940, amava ouvir Duke
Ellington, Tommy
Dorsey, Dorival
Caymmi e Dalva
de Oliveira, o que o fazia, em certa medida, eclético. Aos 18, se mudou para a capital e trabalhou como cantor
de rádio e crooner[1].
Em 1950, foi para o Rio de Janeiro e passou a
cantar no grupo Garotos da Lua. Porém, sua personalidade forte o fazia
indisciplinado e logo foi expulso da banda, vivendo no anonimato por algum
tempo.
Após conhecer Tom
Jobim, gênio da nossa música, e um
grupo de estudantes universitários de classe
média, também músicos, o seu esforço finalmente foi recompensado.
Nascera a Bossa
Nova, agigantara-se João Gilberto. Como que gerado no ventre da nova
tendência musical, o artista brasileiro mostrou ao mundo que menos é mais.
Criou a técnica que deslocou o centro das atenções para o violão. O
instrumento que, na maioria das vezes, acompanhava a melodia principal começou
a protagonizar com fraseado e harmonia sensacionais. A voz possante dos
cantores de rádio da época deu lugar à técnica vocal uniforme, precisa, sem vibratos e sem alarde. O fraseado de Gilberto é tão peculiar e seus
desencontros musicais – entre voz e violão – tão belos que, até hoje, o seu
público é cativo e seu show novidade.
Representando a principal influência de toda uma geração[2], Joãozinho
nem sempre foi compreendido pelo público leigo, mas é fácil reconhecer a sua
originalidade e perfeccionismo. O talento que o permite misturar a batida jazzada do violão com o cantar comedido é
imenso e indiscutível. Com seu requinte, transforma um violão em conjunto e voz
em coadjuvante. Entretanto, de tão sutil a sua maneira de musicar, poucos são
os que entendem, de fato, o seu propósito.
Por fim, um
salve ao grande João Gilberto, porque melhor que escrever é ouvir a banda que ele
carrega na ponta dos dedos tocar:
Para curtir: http://umquetenha.org/uqt/?p=2732