foto: Julay |
Há quase seis anos escrevo sobre Teatro na coluna semanal do Diário de Ilhéus. Em "Coxia" (nome dado à coluna) sempre descubro algo novo quando penso nesta arte completa. É como ler a Bíblia. Você sempre tem uma interpretação diferente para cada versículo, por mais que já tenha lido ela uma dezena de vezes. Há quem diga o contrário sobre a completude do Teatro e que considere a música, as artes plásticas ou até mesmo a dança muito melhor. Não pretendo entrar aqui no mérito da questão. Defendo o que faço – e faço com amor.
Fico tentando entender o que o Teatro atrai. A cada ano, dezenas de jovens me procuram para conhecer de perto esta arte. É fato que muitos vêm ávidos de um dia poder estar na Globo. Não os culpo. Isto é coisa da mídia. E ela, a mídia, sabe como ninguém alienar a juventude (e até mesmo os adultos!). Com isso não estou querendo afirmar que não seja possível você ser reconhecido nacionalmente através do Teatro. Veja o caso de Ritinha, Fabinho, Lamartine e tantos outros que saíram daqui.
Acredito que o Teatro é mágico. Nele, e através dele, as pessoas conseguem ser (muitas vezes) o que não são. Explico: Pela máscara, criam personagens totalmente diferentes de seu dia-a-dia e isto excita. Ser quem você não é pelo prazer de ser e de experimentar possibilidades: essa é a razão de ser do Teatro. Ele estimula, fomenta, desperta, encoraja, permite.
No Brasil, o Teatro entrou pelos Jesuítas, com o objetivo primeiro de catequizar os índios. Eles representavam lendas, heróis e santos. Esta é apenas uma parte da história. Penso ainda em criar um programa de Teatro que, antes mesmo de formar atores, forme cidadãos. Tenho feito algumas experiências que deram certo. Mas, elas ainda estão distantes do que penso, do que desejo, do que quero para os jovens. Por isso, não canso de repetir que no Teatro, a dor finge que sente. Assim como o poeta que mente. Mente porque é capaz de dizer a verdade. Diz a verdade porque é capaz de mentir. Somos todos mentirosos dizendo verdades. Teatro tem um palco. Um palco insustentável e leve.
Essa leveza é representada por um simples gesto. Um gesto pode revelar um texto imenso. A gente fala com as mãos, com os pés, com os olhos, com as costas e, pasmem!, até mesmo sem-movimentos estamos falando no Teatro. Aprendemos a lidar com a emoção, com o corpo, com o estado de espírito. No Teatro a gente chora porque está se sentindo mal? A gente foge só porque está com medo? Não! No Teatro, fugir e chorar acontecem antes da emoção. Assim conseguimos explicar e organizar as ações para o nosso sistema de interpretação. Está aí outra razão pela qual fazer Teatro é fascinante.
Pawlo Cidade é escritor, membro da Academia de Letras de Ilhéus e dramaturgo.