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quarta-feira, 25 de abril de 2012

CULTURA PRA QUÊ? - o artista em dois mundos diferentes - por ED PAIXÃO*


O artista, aquele que transforma o ambiente em que está presente é muitas vezes taxado como um ser desocupado, vagabundo, por uma sociedade que vê na sua presença, um tumor a ser eliminado. O mundo capitalista não entende como o ser humano pode trabalhar e ter prazer nisso. Afinal o capitalismo nos obriga a ter empregos que odiamos para comprar coisas que não precisamos, já dizia isso no excelente filme “O Clube da Luta”. Agora a situação muda de figura quando este mesmo artista está nos holofotes, na mídia, servindo de macaquinhos de realejo em programas de auditórios ou bancando a divindade na tela da televisão. Esta grande farsa é uma epopeia avassaladora de mentes, pois pegamos o mesmo ser humano em perspectivas diferentes.
Então seguindo por estas perspectivas diferentes, o artista pode ser um vagabundo ou um deus, depende do ângulo de visão que o capital nos impõe. O artista vagabundo, caminha numa estrada cheia de pedras pontudas, puxando a carroça palco, utilizando todos os seus músculos para continuar seguindo em frente e em todo lugar que ele para, ele precisa usar todo manejo de seu corpo para ganhar atenção e nessa condição ele tem que agradar os transeuntes, para no final receber algumas moedas, que são dadas como migalha e com desdém. O artista deus chega esbelto na sua carruagem, com um tapete vermelho esperando-o para desfilar e uma verdadeira legião de fiéis aguardando-o para ovacioná-lo.  Todavia o que impulsiona e leva o artista vagabundo a continuar seguindo em frente? Enquanto um serve a arte, o outro serve ao dinheiro e é este é o grande embate que nos assola atualmente.
Tendo como ponto de partida a nossa realidade atual, temos duas peças em cartaz no mesmo dia, a do vagabundo e a do deus, qual peça será que as pessoas optarão por ir ver? O vagabundo pode ser visto em qualquer lugar, uma vez que ele anda no meio destas pessoas, enquanto, o deus são poucas chances de poder encontra-lo pessoalmente.  O valor monetário do espetáculo do deus difere muito do valor do espetáculo do vagabundo, um valor muito mais exorbitante, mas as pessoas estão dispostas a pagar o que for preciso apenas para assisti-lo e no outro dia comentar com os amigos. Então a grande questão é colocada em pauta. As pessoas vão ao teatro para ver o artista ou o trabalho a ser apresentado? A qualidade estética ou a beleza física do ator? Será que estes dois artistas são tão diferentes assim? Um exemplo claro de toma lá dá cá, é ver o artista deus contando uma piada e o público rindo sem saber nem o motivo, apenas porque a massa riu. No outro dia, as pessoas abrem a boca com todo orgulho para dizer que assistiu ao espetáculo do deus e comenta sobre sua aparência, suas qualidades e defeitos e olha que só o viram de voyer. Mas e o espetáculo? Do que fala o espetáculo?
 E o vagabundo teve público? Pouquíssimas pessoas o assistiram e essas pouquíssimas pessoas no outro dia comentavam sobre a peça e a influência dela em suas vidas, como o espetáculo era visceral, verdadeiro, simples e emocionante e como a partir do que viram pensariam duas vezes na hora de decidir o voto durante as eleições. Qual é a grande diferença? O artista vagabundo é um sonhador e acredita num mundo melhor através do seu teatro, enquanto o artista deus ostenta um status que a população capitalista quer alcançar.  Veja a declaração de Leila Marinho Laje ao ver este artista anticapitalista trabalhando na rua: Artistas, pessoas iguais a nós (ou quase), que vivem um mundo diferente, trabalham pelo prazer, pela alegria e satisfação de fazer o que foram predestinados a fazer, mandados por  alguém lá de cima, em algum lugar que não conhecemos. São cidadãos do bem e se sacrificam para viver da arte...”
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Ed Paixão é ator, professor de teatro, palhaço e conselheiro municipal de cultural da área temática de teatro.