“O tipo de relação criada entre o
elemento sonoro e a cena pode determinar uma alteração na temperatura cênica.”
Livio Tragtenberg
Um
som esquenta quando cumpre plenamente as expectativas da cena, esclarecendo, acentuando
ou destacando uma leitura previsível ou já evidenciada. Enfim, imprimindo “alta
definição” à sua intrevenção: dissipando dúvidas, ambigüidades, direcionando a
leitura cênica.
Esta
premissa, enfatizada por Livio Tragtenberg em seu “Música de Cena”
(PERSPECTIVA, 1999) explica bem a função da música no espetáculo. No Teatro,
tudo deve ser minuciosamente pensado. E a música não serve apenas para
“preencher o vazio”, ela é parte integrante, é alma é, ironicamente, luz!
Você
pode até estar perguntando agora: “Como o Som pode ser Luz, se são duas coisas
completamente distintas?” Parece-nos paradoxal, mas o fato é que uma
intervenção sonora neutraliza (se é assim que podemos dizer. Talvez Antonio
Melo, nosso maestro, esclarecesse melhor) quando desvia o foco da atenção
cênica com uma informação autônoma que não estabelece conexão com a situação
cênica, nem cria um novo foco de atenção. “Por exemplo, uma sonoridade
complexa, irreconhecível, desligada do universo timbrístico empregado, e com
uma duração que impossibilita seu reconhecimento pelo espectador”, afirma
Livio.
Quando
montamos há alguns anos atrás “O Sorriso da Borboleta”, escrita a quatro mãos,
a música era a alma da peça. Apesar da trilha ser americana, a letra, o timbre
e a melodia sincronizavam-se com o ambiente da peça. As pessoas se envolviam
com a trama e deixavam-se levar pela história tensa de um jovem que encontrou
nas drogas “o caminho para a felicidade”. Não era uma apologia aos
entorpecentes, mas, um alerta à sociedade sobre os efeitos que a heroína
causava no organismo humano após uma aparente satisfação de prazer. O autor da
trilha e também coautor do espetáculo foi Odilon Neto. Sensível a
musicalidade e configuração da trama ele
não preencheu o teatro com a música. Pelo contrário, contou uma história que
“esquentou” o conflito, liderou um clímax e criou um desfecho numérico entre os
elementos das músicas escolhidas para as cenas criando uma textura
inesquecível.
Assim,
não basta preencher o espaço vazio na cena. Nem estabelecer uma relação direta
do tipo: instrumento A = personagem A. Como diz Livio Tragtenberg: “O tipo de
relação criada entre o elemento sonoro e a cena pode determinar uma alteração
na temperatura cênica.”
______________________
Nenhum comentário:
Postar um comentário