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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Desfazendo equívocos da cidade apaixonada - por Israel Nunes


Do Blog do Gusmão

Ilhéus é uma cidade apaixonada. Não no sentido de que os cidadãos amam apaixonadamente a cidade, mas no sentido de que gostam de discussões apaixonadas em torno de questões simbólicas, emblemáticas.

A nova ponte Ilhéus-Pontal é uma delas. Não se falou em mobilidade urbana, mas sim da ponte, emplastro para todos os males. O porto-sul e a ferrovia é outra delas. Não interessam benefícios ou malefícios. Interessa ser torcida. Quem está comigo é bom, o resto é “papa-jaca”.

Depois de quase esquecida a disputa territorial com Itabuna, inventamos outra: o Colégio-Biblioteca-Arquivo Público General Osório.

Patrimônio arquitetônico e histórico da cidade. Saudosismo de muitos. Histeria de muitos mais. E por que histeria de muitos mais? Porque o Município realizou uma permissão de uso de bem público com uma pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, o Teatro Popular de Ilhéus. A “inteligentzia”, cuja intenção parece ser fazer afagos no prefeito eleito, Jabes Ribeiro, tratou logo de rotular a iniciativa como mais uma incompetência do governo Newton Lima, uma “ilegalidade”, um absurdo inominável.

Confundiu-se falar o que pensa com falar sem pensar. Desfaçamos alguns desses equívocos.

O primeiro deles, de que o TPI tem o firme propósito de ocupar o General Osório. Não tem. O seu Diretor, Romualdo Lisboa, manifestou que não tem interesse em ocupar o local se esse não for um projeto do próximo governo. Disse-me com todas as letras que somente ingressaria em qualquer imóvel publico municipal com a concordância do futuro prefeito, se isso fizesse parte do projeto de governo, pois quer o governo como um parceiro. O TPI só quer uma casa.

Outro equívoco, o de que é uma ilegalidade. Não é. A permissão de uso de bem público é admitida na ordem jurídica brasileira, sendo um instrumento precário – o que quer dizer revogável a qualquer tempo – de ocupação por particulares de bens públicos.

A permissão de uso em nada elide a obrigação do poder público de manutenção e restauração do patrimônio em questão.

Rememoro mais. O Bataclan, que também é um patrimônio histórico e arquitetônico de Ilhéus, foi restaurado com recursos da Petrobrás, no governo de Jabes Ribeiro. E foi cedido para exploração econômica – com fins lucrativos! – à iniciativa privada. À época, o próprio Conselho Municipal de Cultura aprovou a cessão do local já restaurado.

Nem sequer mencionarei o Supermercado Meira, cujo proprietário foi supostamente detido e imediatamente solto dia desses, que ocupa um local próximo ao Terminal Urbano que não se sabe se é público ou privado. Nem mesmo falarei de todos os ocupantes de bens da União – terrenos de marinha – irregularmente existentes em Ilhéus.

O Teatro Popular de Ilhéus administra um volume de recursos de convênios – com finalidade específica – de mais de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) por ano. E são recursos públicos. Por que não poderia administrar um prédio público? E nem se diga que já poderia ter adquirido espaço próprio com esses recursos, pois qualquer ser humano bem instruído sabe que os recursos de convênios destinam-se a finalidades – projetos – específicos, bem como que não há convênio para aquisição de sede/imóvel. Então, o raciocínio é simples: o TPI já administra, há muitos anos, uma soma incalculável de recursos – patrimônio – públicos. Não há nenhuma razão para crer que não poderia administrar o General Osório, revitalizando aquele espaço e criando estratégias específicas para que as pessoas, especialmente os jovens, voltem a frequentar a biblioteca e ao hábito da leitura. Mas, como eu disse, o TPI não quer o General Osório. Só quer um espaço para continuar a tocar os projetos.

Israel Nunes é procurador federal e professor.

Um comentário:

Lunes disse...

Muito bom os esclarecimentos para ver se a torcida ao menos se informa um pouco, razão e paixão não são elementos combináveis.