Convidado
a escrever sobre tudo o que quiser desde que música entre na poção, devem ter
se esquecido de ler minha ficha moral, aquela feita pela opinião alheia. Ouvi
um bocado de músicas que estão devidamente esquecidas e algumas poucas as quais
guardo na memória, no computador, nos cds, nas fitas, nos elepês e que, de
certo, entrarão nesta coluna, nicho, espaço, página ou o que quer que seja este
lugar virtual onde farei o possível para não parafrasear, imitar, copiar,
transcrever, xerocar, mimetizar quem quer que seja. O que sei que já não vai
dar certo, pois o previsível é o arroz de festa do cotidiano.
Nascendo todas as
manhãs, estudando o tempo todo sem lousa e aprendendo sempre onde não se deve
aprender, o autodidatismo me acaricia o ego e me deixa capaz de dizer que erro
sozinho, sem um mestre a me indicar o que devo pensar, evitando assim errar o
erro dele. Dou muita mancada, é só atentar para minha locomoção, mas, paciência
comigo, que garanto informar mal, em curto prazo, e bem, em longo prazo, que
consertar é sempre preciso quando se é impreciso. Voltando a música, que é o
que me foi pedido para falar sobre, tenho quilômetros de discos de vinil. Os
elepês, que me deram alguns centímetros de conhecimento sobre o que me entra
pelos ouvidos, são uma minha paixão - vicio para alguns - e sobre eles posso dizer
que não sentem inveja dos emepetrês da vida, que práticos, e algumas vezes de
qualidade, são, por outro lado, desinformativos e sem identidade, pois que
amontoados nos computadores por aí, não são escutados com parcimônia nem dizem
da onde vieram nem se são parte de algo que os completa ou complemente, o que
já não acontece com o vinil, que, ordenado sob os auspícios de alguém, quando
felizes em sua disposição, querem sempre dizer alguma coisa que interessa a quem
não está com a mente auditiva no automático.
Num elepê, ou até em um cd, seu irmão
raquítico, há informações sobre quem fez o que onde e quando e porque o fez. A
diferença entre um e outro, mp3 e elepês, é a mesma entre assistir um filme
pornô e a pornografia in natura. Mas nada contra modernidades, mesmo que de
moderno mesmo eu não possa chamar quase nada faz muito tempo. E falando em
tempo, Ilheos, minha cidade que eu amo, mesmo tratada há décadas como se fosse
uma merda qualquer, está sim, com seu nome escrito no mapa da boa música dessa
terra de vera cruz, e não só do que assola o os ouvidos do mundo inteiro -
musiquinhas de merda. Aqui se fez, faz e se ouve desde priscas eras, sons que
não deixam a desejar, alias sons que muitos desejam. Sem internet, o dinheiro
jeca dos ricos donos de roça já trazia as novidades do mundo todo. Com a
internet ficou fácil saber e difícil selecionar, resultando em excesso de
opções e escassez de senso crítico. Aqui se faz e fez boa música. Assim como em
todo o planeta. Pouca, claro, que a maioria de tudo sempre é o joio.
Tentarei,
sem sucesso, trazer praqui prece espacinho, o que me der na laje. Assunto não
falta. Lembro agora de Saul Barbosa, Miguel de Deus, Reizinho, Sabará, OQuadro e
uns poucos outros que estão marcados como ouro destas terras. Avisando: modernidade
pra mim, não é mp3 ou qualquer coisa destas que de novas não tem nada, e são
recauchutações dos passados idos reias ou inventados. Modernidade pra mim é
engrenagem de maquinário da era vitoriana. Digital a mim me basta a dos dedos.
E não adianta vender como novidade o que já está aí faz tempo, só mudou a
maquiagem. Retrogrado, elitista, individualista, crítico, ciente da minha
ignorância, trabalharei aqui neste nicho que me deram, e provavelmente vão
tomar de volta, compartilhando convosco, barato leitor, o que eu acho. Se você
acha que o que eu acho não se acha por aí, obrigado.
Qila é pesquisador, crítico de música e pensador nas horas vagas. Todos os sábados ele escreve sobre música.
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