Talvez a flor que carregasse não fosse pra ele, mas sim, tivesse outro
destino. Talvez a luz que guardasse em si tivesse a voz. O sentido
sentido e percebido, que vai muito além do que imagina. A vida toda -
até então - sem saber como lidar com o jardim dos outros, da idealização
dos seus desejos. Sem que prestasse atenção, sem que percebesse, sem
que notasse. De repente era isso. A aflição que sentia, que seu corpo
sentia, que a fazia vibrar estava ligada à toda atenção que seu corpo a
fazia voltar para si mesma.
Para si mesma. Para si. E assim repetia. De repente olhou-se no espelho,
frente à frente às suas idealizações. Frente à sua busca cega. Tudo que
poderia - e deveria naquele momento, digo isso num ato de julgamento
meu - era olhar pra si. Nessa hora ergueu seus olhos em espanto ao
olhar-se no espelho. Não era mais seu simulacro, não era mais seus
pequenos truques. Nos momentos de silêncio, quando não temos ninguém
olhando, quando todos estão longe, é que o corpo nos avisa vibrando que
precisamos lidar com o que tem de mais íntimo dentro de si.
Ela olhou pra dentro e se viu. Por um breve momento fez-se espanto, e
por outro breve momento foi premiada com a sua própria carne misturada
às emoções. Não conteve a si. Comoveu-se. Seu lindo jardim, seus
nenúfares, seus jasmins, suas pequenas flores brejeiras crescendo sem
cuidado. Percebeu que precisava - sim, era uma necessidade tal qual a de
respirar - tocar lá dentro. Ver-se gera um espanto sem resposta, sem
ação. Tocar-se é o momento íntimo. Tocar-se é dizer pra si mesmo que o
que há ali será cuidado.
Tocar é permitir que seu jardim seja, por aquele breve e significativo
momento, cuidado pela única pessoa capaz de fazê-lo real e de mostrá-lo a
quem o mereça - mais que a permissão de ver, que nos é concedida ao
pensar, o merecimento de apreciá-la. Começou ali, a entender. E do
espanto se fez a comoção. Movia-se, emocionada, soluçava. Sem palavras.
Entendendo finalmente o valor dos sinais do seu corpo e do vasto mundo
que se abria ao voltar à sua mente à sua alma, ao seu âmago, à si.
Daí em diante foi trilhar outros caminhos. Momentos de contato consigo
mesmo sempre trazem reflexão. Sempre indicam novos rumos, ensinam novos
caminhos e ampliam as possíveis perspectivas. A vida é feita disso, à
todo momento. Você pode se perder dentro de si mesmo, e ir abrindo
portas que te façam circular e circular. Ou você pode trilhar caminhos
novos. A vida está sempre aberta. Desde que estejamos alertas.
Pedro Paulo é estudante, escritor, pensador nas horas vagas e
poeta quando a inspiração vem. Há 14 anos vive na Bahia, terra que o
inspira e onde nasceram seus primeiros versos. Escreve atualmente no
blog www.pedropaulo.blogspot.com