Edson Bastos no Festival Mix Brasil 2011 |
Edson Bastos é Especialista em Audiovisual pela UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz em Ilhéus-Ba e Graduado em Comunicação Social com habilitação em Cinema e Vídeo pela FTC – Faculdade de Tecnologia e Ciências de Salvador-Ba. Como diretor e roteirista dirigiu os curtas “Joelma”, selecionado pelo edital de Cultura LGBT do Governo do Estado da Bahia, promovido pela Fundação Pedro Calmon e eleito Melhor curta nacional eleito pelo público no Festival Mix Brasil de 2011; “Veras”, Menção Honrosa no XII Festival Nacional de Vídeo – Imagem em 05 minutos; “Jeep”, melhor videoclipe do Festival Cidade Filmada promovido pela UFBA – Universidade Federal da Bahia. Atua também como Produtor Executivo e Curador da MUSA – Mostra Universitária Salobrinho de Audiovisual e do FECIBA – Festival de Cinema Baiano. É um dos idealizadores, produtor executivo e coordenador de conteúdo do projeto “Pixelando” e do site “Pixelando Online”, voltado para formação de público e mão-de-obra para o audiovisual.
Nesta “Entre Vista”, Edson Bastos fala sobre seu premiado curta “Joelma”. A personagem título é uma das primeiras transexuais da Bahia. O curta narra os conflitos de Joelma: diante da não aceitação da sua identidade de gênero por parte de seu pai, é posta pra fora de casa, e se muda para Salvador, onde conhece Antônio, um mendigo por quem se apaixona e com quem se casa. Após fazer a cirurgia de redesignação sexual retorna para Ipiaú, sua cidade natal, onde tem sua rotina bruscamente alterada, com o surgimento de João, pivô do assassinato que mudará sua história... Em 20 minutos, o curta relata e instiga o espectador, levando-o a sentir os conflitos e vibrar pelas conquistas da personagem.
- Como surgiu a idéia de fazer um curta sobre a transexual Joelma?
A proposta do curta surgiu em meados de 2006, quando ainda estudava cinema e vídeo e buscava em personagens da cidade onde nasci (Ipiaú-BA), referências para a construção de novos trabalhos. Foi quando passei a conhecer a história de vida de Joelma que, de tão excêntrica, me chamou a atenção. A partir de então, comecei a escrever o roteiro e busquei captar recursos para a concretização do filme.
- Como você conseguiu viabilizar a realização do curta?
Não foi fácil. Depois de dois anos tentando viabilizá-lo, inscrevendo em editais e concursos, surgiu o edital de Cultura LGBT no ano de 2008, promovido pela Fundação Pedro Calmon e Secretaria de Cultura do Governo do Estado da Bahia. Esperamos um ano pelo resultado do edital, mais um ano para o depósito da primeira parcela e mais um ano para começarmos a produção de Joelma.
- Como foi a escolha do ator Fabio Vidal para o papel de Joelma?
Já na pré-produção do curta, começamos a levantar nomes de atores para fazer o papel de Joelma. Queria que fosse um homem que interpretasse uma mulher, como é Joelma. Abrimos até teste de elenco. Mas logo chegamos a ele. Camilo Fróes foi o produtor de elenco e responsável por chegarmos até Fábio Vidal. Em seguida, pesquisamos o trabalho dele, nos reunimos, conversamos e não havia dúvidas: Fábio era o ator ideal para viver Joelma no cinema, pelas suas características físicas e pelo seu talento. Fábio pesquisou bastante a personagem, foi até a casa de Joelma, fez a sua pesquisa e quando voltou para os ensaios, estava Joelma pronta, com todos os trejeitos no corpo e na fala. Sem Fábio, o filme seria totalmente diferente.
- Outros atores do curta já são bastante experientes em teatro e cinema. Como foi dirigir essa equipe?
Trabalhar com atores que já fizeram cinema é mais fácil, pois eles entendem o que é necessário dentro de campo. Fizemos ensaios periódicos com Fábio Vidal, Rui Manthur que viveu Antônio, o marido de Joelma, com Vinício de Oliveira Oliveira, no papel de João, o assassino e com Eddy Veríssimo vivendo Janaína, a mãe de Joelma. Os ensaios serviram para que eles entendessem o pensamento de cada um dos personagens e ainda as interações entre eles. Esse momento foi muito importante, pois, quando chegamos no momento das filmagens, os atores estavam prontos, sabendo que deveria ser feito. Resultado: nenhum erro no set, mais agilidade e emoção nas filmagens. Um aprendizado muito grande pra mim.
- Você construiu um blog e nele postou todas as etapas de desenvolvimento do curta. Como você percebeu a resposta do público utilizando essa ferramenta?
O público sempre ficou atento às novidades de Joelma. Tanto que, em pouco mais de um ano que o site foi lançado, temos mais de 20 mil acessos no blog (www.curtajoelma.com.br). São pessoas curiosas, querendo assistir ao filme em sua casa ou cidade, deixando comentários de estímulo, querendo saber um pouco mais sobre a história dessa personagem tão rica, mística e diferente de tudo que já viram. Outros gostam de saber o que acontece nos bastidores de uma produção cinematográfica. Enfim, no blog há um conteúdo muito diversificado para diversos tipos de público. Falamos sobre cinema, sobre a história de Joelma, sobre memória, sobre sonho, espiritualidade, sexualidade e muitas outras coisas.
- “Joelma” ganhou o prêmio de melhor curta no festival Mix Brasil de Cinema da Diversidade Sexual, no final do ano passado. Você vem investindo na exibição de Joelma em festivais. Qual a importância desse tipo de exibição e a que você atribui o sucesso de Joelma nesses festivais?
A primeira etapa após a finalização do curta é o investimento no circuito de festivais. São eles que respaldam o filme e dizem se ele foi aceito pela crítica e pelo público. Aqui no Brasil, particularmente, as pessoas valorizam muito filmes que foram exibidos em outros países e depois chegaram ao Brasil, o porquê disso é outra discussão. Inclusive, os Festivais e Mostras hoje são os veículos mais recorrentes para fazer um curta-metragem circular. São poucas as TVS que exibem curtas. É preciso aproveitar esse circuito, criar uma estratégia de distribuição nesses Festivais e Mostras, usufruir ao máximo deles para em seguida buscar outros meios, como as TVS, internet, etc...
O filme mostra, em 20 minutos, trechos da história da nossa protagonista, suas lutas e conquistas. Atribuo os bons resultados que estamos colhendo de Joelma, ao esmero de toda equipe que fez um trabalho mágico: transformar todo aquele simulacro em verdade. As pessoas entram na história do filme, se identificam com a personagem e saem da sessão com um misto de alegria e angústia por conta da vida sofrida dela.
- Você trabalha com planejamento e produção de eventos pioneiros de audiovisual, como a Musa e o Feciba. Qual a importância desses eventos para o interior da Bahia?
O interior do estado da Bahia sofre muito com a falta de aparelhamento cultural, sobretudo no que diz respeito ao cinema. Para se ter uma idéia, em toda a região sul, Ilhéus é a única cidade que possui um cinema, no qual só é exibido filme comercial. É muito difícil termos acesso a uma programação alternativa dentro desse cinema. O FECIBA (www.feciba.com.br) e a MUSA (www.mostramusa.com) chegaram para se tornarem eventos calendários do nosso estado e país, promovendo o acesso à cultura, à formação e aperfeiçoamento de mão-de-obra e espaço de contato direto com realizadores. O FECIBA exibe uma programação exclusivamente de filmes baianos e a MUSA tem o foco nas universidades, pois tudo indica que é daí que surgirá o futuro do audiovisual. Reitero que os filmes exibidos no FECIBA e MUSA raramente seriam exibidos na região e por isso acredito que esta é a forma que encontramos de dar acesso à população a esse conteúdo exclusivo. Outros fatores importantes nestes eventos são o acesso à formação de mão-de-obra por meio de oficinas, o contato direto com realizadores, diretores, produtores, atores e pessoas que fazem parte da história do audiovisual, além de, sempre contar com uma mostra competitiva de curtas-metragens em cada um dos eventos, ações que certamente os cinemas comerciais não fariam.
- Qual a sua opinião sobre a política/mecanismos de fomento ao audiovisual na Bahia?
Não temos política nem mecanismo de fomento ao audiovisual na Bahia. Para que isso acontecesse precisávamos de uma verba específica, com editais específicos para o audiovisual, lançados de forma periódica, preferencialmente anual, o que não ocorre atualmente. Temos editais em um ano e no outro não temos. Isso não ajuda a consolidar nossa cinematografia. Precisamos de mais dinheiro para que mais projetos sejam realizados. Precisamos ainda de um envolvimento maior do setor privado para o investimento nesses projetos. O ditado de que na Bahia as coisas são devagar, pode ser muito bem atribuído aqui. Não faltam filmes participando de Festivais nacionais e internacionais, levando prêmios para o nosso estado, mostrando que o investimento nesse setor é de extrema importância para o reconhecimento da classe, geração de emprego e renda para o estado. Ao mesmo tempo, há uma lista de espera enorme de realizadores ávidos por concretizarem seus projetos. Até pouco tempo, algumas gerações esperaram 20, 30 anos para dirigirem seus primeiros longas-metragens. Isso não pode permanecer num estado que possui mais de 04 universidades voltadas para o audiovisual, com grandes nomes reconhecidos internacionalmente no cinema mundial e com muita gente querendo produzir.
- Quais os planos para “Joelma” daqui para frente?
Em 2012, “Joelma” continua seguindo o circuito de Mostras e Festivais. Estamos recebendo constantes convites de exibições em eventos internacionais, e enviando o filme para participação em Mostras Competitivas de Curtas-metragens. Sempre que o filme é exibido em algum local ou veículo, atualizo nosso blog com essas informações. Já me perguntaram, inclusive, quando vamos ter um longa-metragem sobre a história dela. A resposta é: quando quiserem financiar.
- Quais os planos e projetos de Edson Bastos daqui para frente?
Sigo produzindo os projetos na área de formação de público e mão-de-obra para o audiovisual: FECIBA agora em abril (02 a 07), em Ilhéus, o PIXELANDO – Ciclo de Debates e Oficinas de Audiovisual, e a MUSA para o segundo semestre.
Já na área de produção cinematográfica, produzo o curta “O velho e os três meninos”, dirigido por Henrique Filho e adaptado do conto homônimo do escritor grapiúna Euclides Neto, com previsão de filmagens para maio. Busco ainda a concretização do documentário Cine Éden, que apesar de ter o Cine Teatro Éden localizado na cidade de Ipiaú como protagonista, busca contar uma história universal e comum ao de todos os cinemas de rua. Ao mesmo tempo em que procuro focar em projetos pessoais em ficção como o curta “Astrogildo e a Astronave” e o longa “Os Magros”, também adaptação do romance de Euclides Neto.
Esses são apenas alguns. Projetos certamente nunca irão faltar, pois eles servem como mola propulsora para que eu busque transformar meus sonhos em realidade.
Confira os vídeos abaixo e saiba mais sobre “Joelma”:
Making-of de Joelma:
Teaser 01 – Cirurgia:
Teaser 02 – Prisão:
http://www.youtube.com/watch?v=8J-UODdj6is&feature=player_embedded__________________________________________________________________________
Tacila
Mendes, 26 anos, é
comunicóloga e especialista em Audiovisual pela Universidade Estadual de Santa Cruz. Além de
fotografar e dar aulas nesta área, se envereda pela produção cultural da
região, escrevendo projetos para
captação de recursos e trabalhando também como assessora de imprensa. Fez parte da equipe da 1ª e da 2ª MUSA – Mostra Universitária Salobrinho de
Audiovisual; do projeto
Afrofilisminogravura; do 1º Festival de Cinema Baiano - FECIBA; o Bahia Sound
System e do Memórias do rio Cachoeira.
Gosta também de cantar e faz parte do projeto
"Mulheres em Domínio Público", do qual é uma das quatro
intérpretes. Foi eleita Conselheira
Municipal de Cultura de Ilhéus no setor de Audiovisual (2011).
Como gosta de conhecer gente, seus estilos e
formas de pensar, lugares e tudo que lhe parece diferente e interessante, propõe
um papo "Entre Vistas" a fim de descortinar esses mundos...